O que é um projeto de Gestão de Manutenção?


Alguns profissionais tem dificuldades de explicar o que fazem, e um dia desses me vi nessa situação. Uma amiga me perguntou sobre o que é exatamente um projeto de Gestão de Manutenção, e expliquei contando sobre um artigo que li essa semana. Percebi que foi um bom exemplo, e por isso resolvi escrever sobre ele.

Apresentado no Congresso Brasileiro de Manutenção do ano passado (2020), Thiago Olinto explicou o seu estudo de caso feito em uma fábrica de produtos agrícolas, a aplicação de métodos Gestão de Manutenção, concluindo nas mudanças realizadas e os ganhos obtidos.

O problema dessa indústria de fertilizantes no ano de 2018 era que a linha de produção estava parando um tempo maior que o esperado, ou seja, a disponibilidade estava abaixo da meta quando comparada a outras unidades semelhantes.

Assim ele fez um plano de ação:

Etapa 1: Registro de interrupções e custos por equipamento / Análise  Estatística da Confiabilidade da Unidade Produtiva 

Para quantificar as interrupções foi feito o registro dos tempos entre as falhas por equipamento para cálculo do Tempo Médio Entre Falhas, TMEF (ou MTBF em inglês), e também dos tempos gastos com o equipamento parado para cada reparo para calcular o Tempo Médio Para Reparo, TMPR (MTTR).

Se você não está familiarizado com o que são esses tempos tem o desenho abaixo que fiz pra ajudar a entender melhor:

Etapa 2: Classificação dos 10 equipamentos com pior confiabilidade

Com todos os tempos registrados foi possível então comparar a média das horas de produção parada por falhas por unidade produtiva, selecionando as 10 piores e chegando na tabela:


Etapa 3: Análise gráfica

Para selecionar dentre esses 10 qual equipamento é o mais crítico para a operação o primeiro método que vem à mente seria o Diagrama de Pareto. Entretanto como foram escolhidos dois indicadores independentes o Pareto fica limitado, pois seriam necessários dois gráficos (MTBF e MTTR), que podem gerar diferentes resultados, não sendo suficiente para a priorização.

Para resolver essa limitação o autor do estudo propôs utilizar o Diagrama Jack-Knife (JKD), um método que permite relacionar dois critérios simultaneamente, classificando os eventos ou equipamentos em críticos, crônicos (repetitivos) e críticos - crônicos em diferentes quadrantes, conforme podemos ver pela tabela anterior já plotada abaixo:

Alternativo

Etapa 4: Seleção do equipamento com pior desempenho

Partimos então para a escolha do equipamento que apresenta o pior desempenho, ou seja, nesse caso a máquina que mais interrompe a produção da fábrica.

Através do gráfico Jack Knife foi possível identificar o granulador (120-RR-22) e o transportador 08D (120-TP-08D) como os equipamentos com maior impacto negativo, pois localizam-se no quadrante superior a direita, sendo críticos e crônicos. Entretanto, o granulador tem maior impacto do que o transportador, pois está mais à direita e mais acima.

Assim conclui-se que o granulador rotativo é o equipamento que representa o maior potencial de retorno, apresentando o maior número de falhas de toda a unidade produtiva e o maior tempo médio para reparo dentre os dez equipamentos selecionados.

Definição do problema: falhas ou reparo?

Com o tempo de quase 70 horas de equipamento parado para reparo pelo granulador, e sendo o maior tempo médio de reparo da planta, o autor decide focar nesse ponto para aplicar as ferramentas do Método de Manufatura Enxuta (Lean Manufacturing).

Etapa 5: mapeamento do fluxo de valor (VSM) do reparo

Para analisar o estado atual e projetar um estado futuro do reparo do granulador foi aplicada a ferramenta de mapa do fluxo de valor (Value-Stream Mapping - VSM). As atividades que tiveram foco foram as manutenções corretivas não programadas, que são consequência das falhas do equipamento.

Na construção do mapa do estado atual foram listadas as 7 etapas necessárias para a execução da manutenção corretiva no granulador rotativo, independentemente da falha apresentada, conforme mostrado no fluxograma:

 

No mapa do estado atual é interessante observar que a agregação de valor por parte da equipe de manutenção acontece somente na etapa 6. O restante do tempo é considerado como desperdício ou incidental.

Em seguida foi redesenhado o processo, buscando potencializar o tempo dos colaboradores tentando manter somente as atividades que agreguem valor, tendo como resultado as 4 etapas explicadas pelo mapa do estado futuro:

Etapa 6: ações para redução de desperdício

Para que a redução das etapas fosse possível foi necessário criar um posto avançado contendo os materiais e ferramentas necessários para a execução da atividade, representado no mapa futuro como kanban de peças sobressalentes e oficina avançada.

Ganhos com o projeto

As ações planejadas foram implementadas no recesso de final do ano de 2018, começando o ano seguinte apresentando resultados positivos, com 20% de redução do tempo para reparo. 

Essa redução de 0,45 horas na média representa no ano de 2019 um ganho em horas disponíveis para operação de 12 horas. Considerando que a planta produz em média 90 toneladas/hora, o tempo disponível para operação possibilita um aumento de volume de produção de aproximadamente 1.100 toneladas de fertilizante. Além disso, com a redução do tempo médio de restabelecimento, a equipe de manutenção ganha essas mesmas horas a mais no ano para execução de outras atividades.


Portanto, esse projeto de aumento de disponibilidade foi um caminho percorrido pela empresa, desde a estruturação para o registro de interrupções de produção, a maturidade da equipe para entender oportunidades em seus processos até a disposição para mudanças e melhorar processos. Esse processo deve ser repetido como um ciclo, sendo refeitas as medições e priorizações, tendo como resultado a cada ano uma empresa mais otimizada e produtiva.

A manutenção industrial lida com vários aspectos: gestão de pessoas, métodos de análise, boas práticas, segurança do trabalho, e também obviamente em conhecer sobre o maquinário de produção e suas particularidades. E um projeto de Gestão de Manutenção é a associação dessas diferentes habilidades para resolver um problema.

Até a próxima!

Rodrigo C. Jacobs
Engenheiro Industrial Mecânico
Gestão de Manutenção, Esp
Automação Industrial, MBA

 

 

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